A luta sindical é guerra

Francisco das Chagas Barroso

Homens da guerra, como Alexandre, Átila, Leônidas e Aníbal despertavam imensurável admiração da tropa, devoção do povo e respeito dos inimigos, principalmente por preferirem a glória de perecer lutando contra os valentes e valorosos guerreiros a experimentar a insalubre vitória sobre os fracos e covardes.

Me permitam os colegas leitores deste respeitável blog, neste momento oportuno, de relatar uma vivência sindical a constituir uma evidência de que só se faz respeitar aquela entidade sindical que realiza enfrentamentos, se impõe, seja em mobilizações de greves, operações padrão, etc., seja em formas de denúncias contra os gestores corruptos.

O ano era 1996 – ano de muita luta no âmbito dos servidores da Justiça Federal (TRE, TRF e TRT) para aprovar o plano de cargos e salários pretendido. Naquela época, Técnicos, Auxiliares e Atendentes Judiciários, hoje, Analistas e Técnicos Judiciários, se mobilizavam em todo o Brasil.

Conquistas ocorreram para a categoria, principalmente a justa recomposição salarial gradual ao longo dos anos seguintes e as gratificações, até se consolidar como carreiras mais bem pagas e valorizadas do país.

Naquele mesmo ano, morando em Cuiabá-MT, no cargo de Auxiliar Judiciário, do Tribunal Regional Eleitoral, quando ainda acreditava ingenuamente na luta sindical de base, ajudava o denominado SINDIJUFE – Sindicato dos Servidores da Justiça Federal, que representava o TRE, TRF e TRT a brigar – isso mesmo, brigar com o Presidente do TRE/MT, à época. Tratava-se de um desembargador arrogante, ditador e insensível. Desprezava seus servidores e nem sequer recebia o sindicato para dialogar.

Pois bem! Ocorria que o Presidente da entidade sindical, um gaúcho, que, infelizmente, não mais me recordo o nome, fazia por merecer o cargo, pois era destemido e despertava a admiração e respeito da categoria, e, diante do tratamento dispensado pelo presidente do TRE, logo partiu para o combate. Era guerra declarada!

Então o sindicato, organizado, criou uma rede de informantes e colaboradores com os próprios sindicalizados lotados nas diversas seções fornecendo informações e documentos com vistas a subsidiar as denúncias contra a pessoa do Desembargador vilão.

Me recordo – com muito orgulho – de, por vezes, discretamente, me alongar ao expediente no setor de compras e licitações, onde era lotado, para tirar cópias de documentos que instruíam processos licitatórios suspeitos e enviar ao sindicato. E assim também outros colegas reuniam provas de pagamentos de diárias irregulares ao próprio presidente e outros desembargadores, etc. Confesso que temia represálias, pois me encontrava em estágio probatório.

Com essas medidas, efetivamente foram apresentadas pelo sindicato, sempre precedido de autorização da categoria em assembleia geral, ao logo do mandato do presidente daquele tribunal, dezenas de representações por atos de improbidade ao Procurador do MP Federal em Cuiabá, onde algumas prosperaram, resultando em uma mácula na carreira e quase um infarto do dito denunciado, o qual, orgulhoso, intransigente e já em final de mandato, não cedeu.

Ocorreu, entretanto, que um dos primeiros atos do presidente que o substituiu foi convidar o sindicato para sentar à mesa e dialogar, certamente não por gostar da entidade, mas sim, por respeito e porque temia a repetição do enfrentamento antecedente. Os dois anos seguintes com aquele presidente do tribunal foram, ora de embates, ora de cordialidades, mas com o merecido respeito daquela autoridade e com várias conquistas de reivindicações encalhadas na gestão anterior.

Foram, portanto, momentos de conquistas, mas sempre lembro que nas reuniões sindicais era sempre enfatizado que a luta sindical é guerra constante e os momentos de conquistas ou derrotas são apenas batalhas. Os momentos de imobilização são apenas tréguas. Não pode haver armistícios duradouros.

Mesmo diante da realidade sindical atual, cujos valores mais caros parecem haver ficado no meio do caminho da história, acredito que a peleja sindical deve se constituir de uma luta constante, de inteligência, astúcia e até de força em último caso, pois é uma guerra, e, na batalha, somente o inimigo destemido e valoroso é respeitado e temido. O resto é puro peleguismo.

Não é demais observar que as conquistas dos trabalhadores mais relevantes dos últimos séculos – na revolução industrial, crianças trabalhavam até 16 horas por dia, sem justa remuneração – não ocorreram por benevolência dos patrões/governos ou por atos amistosos de dirigentes sindicais cordatos, mas sim, por verdadeiros atos de bravura dos trabalhadores e líderes, na autêntica e heroica luta sindical.

franchaba@bol.com.br

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