Como todos sabemos, existe gente oportunista por todos os lados. Infelizmente. Essa deformação do caráter humano causa profundas mágoas e ressentimentos em todos nós; afinal, o oportunista é uma espécie de traidor da nossa boa-fé e confiança, fatos que, por vezes, só descobrimos muito tempo depois. Embora o oportunismo esteja por toda parte, há uma área em que ele fica mais evidenciado, que é a política. Há muitos políticos que não pensam nem duas vezes para mudar de partido, obviamente para atender aos seus interesses mais imediatos, digamos. E o programa do antigo partido que ele jurava defender e cumprir? E os seus eleitores que, esperançosos, confiavam nele, votando e elegendo-o quando ele ainda defendia o ideário do outro partido? Sem a menor cerimônia, tudo isso será simplesmente mandado às favas no primeiro momento em que o politico oportunista vislumbrar uma nova situação que melhor satisfaça aos seus interesses, nem sempre confessáveis.
Nesse campo, o oportunismo não fica só nisso, não. Existe uma espécie muito comum de político que, ao se candidatar, vira outra pessoa: de uma hora para a outra, passa a cumprimentar todo mundo, interessa-se pelos problemas das pessoas mais simples, dedica atenção a todos, sejam ricos ou pobres, olha nos olhos e procura transmitir franqueza e sinceridade, etc. Pessoas costumeiramente fechadas, algumas até arrogantes e antipáticas, como num passe de mágica, quando se candidatam, transformam-se em simpáticas e atenciosas figuras, acessíveis a todos. Mas, que ninguém se engane; passada a eleição, tudo voltará ao normal. Principalmente diante de uma derrota, o lobo rapidamente tira a pele de cordeiro e volta ao seu estado de natureza. A providência seguinte é sumir das ruas e praças, pois agora ele não terá mais de se dar ao trabalho de cumprimentar as pessoas do povo. Em seguida, ao dar adeus aos sorrisos simpáticos, a ordem então é fechar a cara e tentar esquecer tudo o que foi dito e prometido no período de campanha eleitoral. Aí está o retrato acabado do mais puro e deslavado oportunismo político, infelizmente ainda muito comum entre nós.
Quando essas pessoas estão no poder, o oportunismo se expressa sob diversas modalidades. A primeira delas é a farra do loteamento dos cargos públicos, onde o que menos conta é a competência de quem será nomeado. Os cargos e as funções serão ocupados de acordo com os mais baixos interesses das alianças partidárias que, depois de vencida a corrida eleitoral, estão ávidas pelo poder. E, nesse afã, os oportunistas não se fazem de desentendidos; ao contrário, adotam uma postura agressiva e partem para cima do bolo, para garantir logo a sua fatia. Algumas vezes, não há cargos suficientes para acomodar todo mundo. Nessas horas, o que fazer, então? Simples: criam-se mais e mais cargos, somente para atender aos objetivos eleitoreiros e saciar o imenso apetite dos partidos da base aliada.
Enquanto isso, o interesse do povo ficará relegado às moscas, até que sobrevenha nova campanha eleitoral, em que o oportunismo de plantão fará com que as esperanças (do povo e dos políticos!) sejam renovadas, com as conhecidas e manjadas promessas que eles bem sabem nunca sairão do papel. Como o povo, além de boa-fé, tem a memória curta, muitos oportunistas voltarão e, com um discurso recauchutado, repetirão a cantilena do velho roteiro previamente traçado, em que a ordem é transmitir sinceridade e esperança, e prometer progresso, geração de empregos, boas escolas, saúde, etc. O político oportunista é como se fosse um Janus, um deus da mitologia greco-romana que tinha duas caras: uma que olhava para frente e outra para trás. Aqui no Brasil, como sempre, inovamos em matéria de esperteza: os nossos políticos oportunistas são mais que um “simples” Janus, pois têm várias caras. O pior de tudo é que, em geral, todas essas caras, além de serem de madeira, são cínicas e nenhuma delas tem sequer um resquício de vergonha. Lamentavelmente, muitas dessas pessoas passam uma vida inteira representando e traindo a fé popular, e sendo eleitas e reeleitas.
* Agente Fiscal de Rendas, mestre e doutor em Direito Financeiro (Faculdade de Direito da USP)
ARTIGOS de JOÃO FRANCISCO NETO
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