João Francisco Neto
Winston Churchill (1874-1965), estadista e escritor inglês, uma das grandes figuras históricas do século XX, costumava dizer uma frase emblemática: nunca se queixe e nunca se explique. Essa expressão curiosa demonstrava o espírito de uma pessoa decidida, que assumia seus atos e não esperava por compreensão ou compaixão dos outros; alguém que tinha consciência de que viver não é fácil e exige de nós muita atitude e determinação. Pois bem, aqui no Brasil, desde sempre, floresceu entre nós o espírito do “coitadismo”. São milhões e milhões de indivíduos que sempre esperam que alguém venha em seu socorro; seja o governo, a Igreja, alguma instituição, ou até o vizinho; desde que venha em sua ajuda. Alimentadas por esse chamado espírito do “coitadismo” estão legiões de pessoas: os sem-terra que almejam uma gleba para “produzir”; os sem-teto que sonham com uma “casa própria”; os quilombolas que pretendem retalhar as terras do antigo quilombo; outros que querem cotas para tudo, na universidade, no serviço público; outros tantos, mais modestos, que se contentam apenas com uma cesta básica mensal; alguns milhões que se acomodam com as bolsas-família da vida; vendedores ambulantes que acham que temos a obrigação de comprar seus produtos. Enfim, essa lista é extensa e seguramente será cansativa.
O fato é que, de uma forma ou de outra, essas pessoas se veem na condição de coitados, merecedores, portanto, de algum favor que haverá de ser proporcionado por alguém ou alguma instituição, seja lá o que for. A cultura do “coitadismo” está entranhada na vida nacional e alcança muito mais gente do que se poderia imaginar à primeira vista. Por exemplo, crianças e jovens mal educados e sem limites, que acham que tudo podem, também se encaixam na lamentável condição do “coitadismo”. Contra eles nada pode ser feito; eles reinam absolutos, em casa, nas ruas e nas escolas. Coitados. Outro exemplo? Funcionários públicos mal remunerados que, em contrapartida, também atendem muito mal. Muitos acham que eles agem assim porque são uns coitados que não recebem um salário digno. Boa parte do “coitadismo” tem seu fundamento na lei. É o caso dos “menores de idade” que, a cada vez mais, cometem crimes violentos, mas, mesmo assim, a lei lhes reserva um tratamento de coitadinhos, e, por isso, quase nunca são punidos. Não há muito tempo, a imprensa nos deu conta de que um aluno de 14 anos havia esfaqueado a professora em sala de aula.
Não se pense que apenas os pobres são acometidos pelo “coitadismo”. Por aqui o que não faltam são empresários muito bem postos na vida, que recebem generosos favores do governo, e, ao mesmo tempo, se consideram vítimas desse mesmo governo, que lhes cobra muitos impostos; por isso exigem, como compensação, linhas de crédito privilegiado, benefícios fiscais de toda sorte, anistias, isenções, refis, etc. A ideia central é que, como você é vítima de alguma coisa ou de alguma situação, tudo haverá de lhe ser permitido ou proporcionado, desde que isso resulte em algum benefício. Há políticos (e políticas!) que também exploram o viés do “coitadismo”.
Em meio a tudo isso, vicejam grupos de manifestantes que passaram a explorar a “culpa social”. Esses grupos, arvorando-se a porta-voz de todos os desprivilegiados da sociedade, julgam-se autorizados a lutar contra as “elites”, o grande capital, os exploradores do povo, os “poderosos”, enfim. Por isso, saem às ruas para protestar e “manifestar”, ou seja, quebrar tudo e interromper o trânsito nas grandes avenidas. Infelizmente, não são poucas as pessoas que se acham capturadas pelo espírito derrotista do “coitadismo”. Em grande parte, são pessoas de grande potencial, mas que incorporam um papel dramático e de autocompaixão que conduz ao conformismo. E, assim, bloqueadas para as suas próprias potencialidades, permanecem como vítimas de um “sistema cruel e injusto”, à espera de alguém que venham resgatá-las. É o “coitadismo” que se eterniza.
* Agente Fiscal de Rendas, mestre e doutor em Direito Financeiro (Faculdade de Direito da USP)
ARTIGOS de JOÃO FRANCISCO NETO
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